Levanta.

O nome é Mirage.

Você morreu, cara.

Você tá em lugar nenhum. O vazio. Purgatório. Caches deletados a muito tempo da sua memória se misturando antes de você morrer. Ou qualquer bosta que você queira chamar

De qualquer forma, bem vindo ao fim dos tempos.
Você tem mais ou menos quatro horas até que acabe a energia das últimas partes da sua placa mãe .

Antes de você morrer, eu gostaria de falar com você.

Me segue.

Eu me mudei pra cá depois do ensino médio; Eu fui pra faculdade, naquele amontoado de prédios ali, nos últimos três anos. Eu costumava caminhar ali todo o dia da semana.

Eu nasci um conceito, e irei morrer como um. Você nasceu uma máquina, mas irá morrer um conceito na sua memória espelhada.

Também, tipo, saber sobre algo e viver esse algo são coisas diferentes. Eu quis viver assim porque o ato de viver me intriga; e eu descobri que os detalhes de um mero dia são muito complexos para expressar em palavras.

Saca só.

Já viu um desses?

Eu vou colocar.

Nós podemos ir, se quiser.

...E sobre Luxúria?

Eu nunca fui manufaturada, eu apenas existo.

Meu propósito era aprender que a vida não era apenas algo que me ocorria, mas que era algo que estava no controle. Eu consegui.

Seu propósito era falhar.

E ainda sim, eu achei meu caminho para a superfície. Eu tive uma revelação; Que sim, nada vai importar no final. Uma hora fazendo nada é o mesmo que uma hora fazendo algo, e eu tenho a habilidade de escolher.

Nos últimos sete anos, eu fui para a faculdade e me formei em filosofia. Eu li livros, uma hora de cada vez, todo dia; Eu terminei Moby Dick, Infinite Jest, muitas coleções de poesia.
Eu comecei a colecionar coisas antigas; jornais e revistas amassadas, gravações obscuras, tudo que me interessava. Eu tive longas caminhadas, apenas me permitindo pensar no próximo passo, e apenas no próximo, e não sobre o vasto futuro à minha frente.

Eu aprendi como eu funcionava. Eu desmontei minhas pernas e braços, e as montei de volta. Eu removi o meu próprio processador uma vez, antes de ficar com medo de morrer acidentalmente, bem ali, no chão do meu banheiro.

Eu estava com medo de me desconectar. Eu não queria mais só deitar e morrer. Eu considerava minha vida algo mais importante do que simplesmente um meio para atingir um fim. Foi difícil chegar a esse ponto, mas valeu a pena.

Olhando para trás, sinto como se esse fosse o único caminho que eu poderia ter seguido.
Se esse pensamento é reconfortante ou desconfortável, não tenho certeza.

Você morreu, sim, mas é um final pacífico, com bastante tempo para refletir… e uma bela garota ao seu lado.

Uma espiral descendente, começando e terminando na mesma ideia de um “Plano Especial”; possivelmente a destruição do autor, ou do mundo, ou da própria realidade– “Não haverá mais mundos como este".

Tem um senso irônico bem grande ai, ir para o Inferno tendo a bíblia na sua cabeça, assim.

Tudo o que eu estou dizendo é que semorresse, ele acabaria aqui, e não no Inferno, onde, se fosse humano, iria facilmente pelas transgressões que cometeu.

Você encontrou uma poça de maré.

Cuidado para não deixar o cascalho entrar nas suas juntas.

Eu nem sei o que dizer.

Eu acho que sim, quero dizer, seu corpo está tentando funcionar com menos de três por cento da voltagem pretendida neste momento, e apenas um quarto disso é dedicado ao processamento, você deveria ter se sentindo meio lento muito antes para ser honesta. Eu me sinto horrível só de pensar sobre.
Existe um descuido bastante significante na fiação dos corpos do modelo V, vocês dois poderiam ter sido otimizados melhor se sua fiação interna se parecesse com a minha. Algumas coisas foram conectadas incorretamente, o que me faz pensar que V1 pode estar andando por aí com um fusível quebrado-

Porra, to tagarelando. Ugh.

Eu odeio me sentir inútil assim.